Por Fefa Costa
Fotos de Rogério Montenegro
Mudar de cidade, de tempero, mudar o foco profissional e se reinventar em prol da família ou de um desejo, são algumas das mudanças que milhões de mulheres fazem ao longo da vida em busca de sonhos e melhores condições financeiras. A presença feminina no mercado de trabalho em 2013 foi de 55,1% na região metropolitana de São Paulo, de acordo com a pesquisa feita pela Seade e pelo Dieese.
Uma fatia tão ampla da força produtiva, já deixou de ter sua renda considerada complemento familiar e passou a ocupar papel protagonista no sustento de muitas famílias brasileiras. Mas a vida profissional bem sucedida, ao contrário do que previam gerações passadas, passou a fazer parte do imaginário feminino. Ao invés de buscar uma “ocupação” e se preocupar apenas com renda, hoje as mulheres buscam sonhos e dão um novo viés aos planos de carreira.
Investir em um projeto
Homens e mulheres concordam que a busca por reconhecimento é um dos principais motivos para mudança de emprego. Mas a palavra “reconhecimento” é diferente para os gêneros, segundo uma pesquisa realizada pelo banco HSBC.
Para os homens, na maioria dos casos, reconhecimento está associado à realização financeira. Para mulheres, também em sua maioria, reconhecimento é também ter mais tempo para familiares, amigos, cuidados pessoais ou investir em projetos.
Laura Guimarães, por exemplo, é formada em Cinema, e sempre foi ligada em literatura. Desde pequena, imaginava histórias a partir de cenas do cotidiano.
“Me apaixonei por roteiros, mas comecei a trabalhar com marketing, como redatora, para pagar os estudos. Durante muitos anos, trabalhar com redação e conteúdo foi minha principal fonte de renda.”
Em 2009, propôs a si mesma um exercício: escrever histórias curtas, de até 140 caracteres. Após um ano, adicionou ao projeto o conceito de arte acessível e começou a espalhar suas histórias pelas ruas de São Paulo, que ela chama de microroteiros.
“Os lugares que mais gosto de colar (os microroteiros) são os postes. Aquela coisa cinza, sem vida, no meio do nosso caminho. Também gosto de colar próximo a pontos de ônibus, onde as pessoas ficam muito tempo sem ter o que fazer.”
Desde o ano passado, Laura apostou nos microroteiros, pesquisas e roteiro para cinema. Ela também tem realizado oficinas em unidades do SESC e em outros lugares, em muitas dessas ações, faz micros de histórias escritas ou contadas por outras pessoas. Com isso, suas observações ganham vida, transformando a roterista de marketing em contadora de histórias.
“De tempos em tempos bate um medo. Já pensei em desistir muitas vezes. Mas então lembro o que realmente importa e vou em frente. Os frutos dele são muito recompensadores.”
Outro lugar
A mudança de Isadora Monteiro foi geográfica, 2.422 km de Maceió para São Paulo. Recém-formada em jornalismo, Isadora encontrou um mercado de trabalho limitado em sua cidade. O conforto de estar próxima aos entes e um noivado não foram suficientes para conter o desejo de mudança.
“Eu não tinha sonhos, só tinha um plano: R$ 800 no bolso pra pagar o aluguel e comer. Se dentro de um mês eu arrumasse emprego, ficava. Senão, voltava.”
Cinco anos se passaram e Isadora não voltou à praia de Pajuçara. Ficou e hoje considera sereno aquilo que antes achava pacato. Aprendeu a andar de metrô, mas ainda sente saudades do mar, do forró e de sempre encontrar conhecidos pelas ruas – situação difícil de acontecer em uma megalópole.
“Tive experiências profissionais incríveis. Trabalhei com Leci Brandão, entrevistei Hans Donner para uma revista de decoração na qual eu era repórter, trabalhei numa revista de paisagismo e conheci Holambra, coisas que eu jamais conseguiria na minha cidade natal.”
Mundialmente, o número de mulheres que mudam de cidade, ou de país, é superior ao numero de homens. Dados do ministério do trabalho revelam que a migração feminina já representa 51% das migrações. A principal motivação é a busca por melhores oportunidades profissionais.
Temperos e delicadeza
Herlly Dias era uma criança que se divertia na cozinha. Mexer em panelas e buscar temperos era a brincadeira predileta da menina, que virou profissão. “Me encantava com as cores e as mudanças dentro da panela”, revela.
Depois de anos de domínio masculino na gastronomia, as mulheres decidiram se apropriar das bandejas e dos utensílios de cozinha. Uma pesquisa do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes mostra que a participação feminina no setor aumentou 79% desde 2000.
Depois de muito pesquisar e estudar a culinária de diversos cantos do mundo foi na volta para a casa que ela encontrou o ponto certo. Natural de João Pessoa, a chef paraibana gosta de voltar para casa de carro e pelo litoral. A mudança de paisagem, conversas, lembranças e fotos a despertaram para os temperos e pratos de sua infância.
“Quis resgatar aquele prato de vó e aquela receita da mãe. A delicadeza e o carinho de uma culinária afetiva, que cuida de quem come. A culinária nordestina me dá prazer”. Ela então decidiu investir seu conhecimento para aplicar procedimento internacional aos pratos típicos do sertão.
“Teve uma vez, depois de muito pesquisar, que cheguei a um carpaccio de carne de sol. A combinação do sofisticado e rústicos. Fui elogiada com o título de ousada”, conta entre risos. “Busquei inovar em técnicas e acabar com mitos da culinária tradicional.”
A maior conquista pessoal, ela diz, foi quando encontrou – com técnica – o ponto certo do quebra queixo (doce de coco com calda de açúcar), que era feito por seu avô. “Na hora do preparo, quem estava ‘pra dentro’ da cozinha não podia ‘passar pra fora’, senão perdia o ponto”, explica um dos muitos mitos que cercam os pratos e temperos do Nordeste.
Herlly mudou o rumo de suas pesquisas gastronômicas e, hoje, é chef de um dos restaurantes mais badalados de Alagoas coordenando um laboratório gastronômico de culinária regional. “Ter investido na culinária nordestina me faz vir feliz ao trabalho, criar e despertar sentimentos. Na simplicidade de cada prato é onde surgem minhas ideias.”
Mudança como rotina
“A mulher se preocupa com o arroz, feijão na mesa e com a conta também. Mas, diferente do homem, dá importância ao vestido da filha, ao brinquedo do neto e com o bolo para comemorar um aniversário”. É assim que a controladora de acesso Dilma Rodrigues, que trabalha em um bicicletário da CPTM, define a disposição das mulheres em busca de melhores salários e, consequentemente, temerem menos as mudanças.
No país, 38% das famílias têm mulheres como provedoras e, em 10 anos, as mulheres aumentaram em 70,4% o volume de vagas com carteira assinada no setor privado, pelo PNAD.
Mãe de cinco filhos e avó de dois netos, Dilma Rodrigues encontrou nos filhos e no passado de muitas privações, força para encarar desafios. ‘Uma vez, um chefe me disse: ‘Quem nasceu para ser rabo, nunca será cabeça.’ Eu tinha 17 anos, aquilo me marcou tanto que decidi que nunca mais ninguém iria duvidar da minha capacidade.”
Ela, que já foi professora de informática, auxiliar em creche, assessora política e líder comunitária, buscou energia no desejo de dias melhores para ela e sua família. Quando surgia o desafio de uma nova proposta profissional, mergulhava nos estudos para dar conta do recado. Mudar é uma rotina para Dilma.
“Vejo meu marido há 12 anos na mesma função. Às vezes fica insatisfeito, mas não muda. Brinco que ele grudou o umbigo. Eu não sou assim. Não fujo da mudança e trabalho para que ela seja para melhor.”
Dilma está cursando o segundo ano da faculdade de pedagogia, com tantos rumos e ramos, o sonho dela é voltar para o ponto de partida. “Meu primeiro emprego foi em uma creche. Quero voltar e, mais madura, fazer aquilo que amo. Para mim, ser mulher é assim, mudar sempre e por amor.”
Artes, temperos e atitudes. A mulher pode mudar e inspirar toda uma sociedade. O ironicamente chamado “sexo frágil” teve em sua trajetória muitas lutas por direitos e liberdade, permeadas por nomes e gestos fortes. Mas vale lembrar que as maiores mudanças feitas por mulheres começaram nos corações e nas mentes.
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